quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Partícula de Deus

Encontrei! Encontrei! Caríssimos amigos da comunidade científica, venho a público declarar a minha mais recente descoberta, que irá abalar os pilares da Ciência contemporânea: encontrei o famoso Bóson de Higgs, apelidado por vocês de "Partícula de Deus", biblicamente e popularmente conhecido como "Grão de Mostarda"! Isso mesmo, caríssimos! Eu o encontrei! E não precisei de nenhum acelerador de partículas! Precisei realizar apenas três singelos gestos: Coloquei os joelhos no chão, rezei e olhei para os jardins.

Olhem para os jardins, caros cientistas! Olhem para os jardins!

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Véspera

Amanhã é o dia! Estou contando as horas. Da Anunciação do Anjo ao momento de agora, já se foram nove meses. Nove meses fazendo-Me pequeno no seio da Virgem, minha Mãe. Molde humano escolhido por meu Pai, para ceder-Me o sangue que correrá em minhas humanas veias. Molde, em forma de útero, que agora é casa de um Alguém que não cabe no Universo. Pai, como Tu és sábio!

Foram algumas semanas sentindo na pele, literalmente, a magnífica manifestação da vida, que explode por meio da dança das minúsculas estruturas celulares que se agrupam e se completam, movidas pela silenciosa canção da Criação. Canção entoada, constantemente, pelos divinos Pulmões.

Foram muitos dias despojando-Me de toda a Ciência, Sabedoria, Onipotência e Glória que Me são naturais. Trago apenas aquilo que todos têm em seu interior e que, infelizmente, tornou-se invisível a Humanidade, devido à ação destruidora do pecado: a Aliança com o Pai. Eu, que Sou a hermenêutica do Criador, faço-Me igual a tantos, para ensinar-lhes quem é o Amor!

Estou ansioso para vivenciar todas as etapas do desenvolvimento humano. Sentirei toda a graça que meu Pai concedeu aos Seus Filhos: a graça de ser criança, de ser jovem, de ser adulto. E sei que não será uma vida fácil, pois venho para sofrer, para apanhar, para chorar. Mas venho, acima de tudo, para amar, para salvar! Eis a minha divina Missão!

Agora, eis o momento! O divino relógio do Pai já marca o dia e a hora! Chegou a plenitude dos tempos! É amanhã! Amanhã, no alvorecer dos corações sofridos, em meio a sublime riqueza da pobreza, meu choro de criança ecoará pelo mundo! Amanhã, no silêncio das grutas-berçário, com o auxílio das humanas mãos do meu pai José, nascerei numa manjedoura!

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Advento

Ela vem vindo! Levantou-se na plenitude dos tempos, despertada pelo Criador. Retirou o pó do deserto. Banhou-se na Fonte que não cessa de jorrar Água Viva. Enfeitou-se com o seu melhor vestido. Vestido de Festa. Longo. De uma brancura ímpar, em contraste com os seus belos negros cabelos estrelados. No alto da cabeça, prendendo o gracioso penteado feito pelos anjos, traz a diadema da Aurora, com uma grande e brilhante Estrela, que indica, com os seus fulgurantes raios, a direção do Grande Acontecimento.

Vem caminhando lentamente, desfilando na divina procissão do Advento, trazendo ternura e lágrimas aos corações humanos que a aguardam e que já sentem a sua silenciosa presença. Vem para repetir-se, como ocorre todos os anos, pela graça da extrapolação da dimensão do tempo, obra divina das mãos do Pai. E não vem só. Vem seguida pelos três companheiros, oriundos das mais distantes terras, que trazem presentes ao Anfitrião.

E chegará em breve, no final do entardecer, quando o Sol estender o tapete vermelho das boas-vindas. Vem se fazer presente nas inúmeras Beléns espalhadas pelo mundo. Nas inúmeras grutas-corações ansiosas pela Salvação. Os coros angelicais já se preparam para entoar os cantos de Glória. Ela está chegando! Ela, chamada Noite, a mais magnífica de todas as noites! A Noite que presenciou o maior de todos os acontecimentos que o mundo já viu! A Noite do Nascimento do nosso Menino Rei!

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Vida Inteligente

Procuram vida inteligente em outros planetas. Será que não encontramos mais nenhuma por aqui? Procuremos por aqui! Há tantas vidas inteligentes escondidas nas terras, nos mares, nos ares e, principalmente, nas praças, nas ruas, nos bares. Nos corações corroídos pelas tribulações do dia-a-dia. Nos Planetas-barrigas de tantas mães desesperadas que recorrem ao crime do aborto. Ventres cheios de vida. Cabeças cheias de nada. Ah, Senhor, vida inteligente que se perde, fruto da ignorância e da crueldade!

Tantos olhos voltados para o céu, tão ávidos pelo menor sinal de uma inteligência estrangeira! Oh, Pai, esquecem-se de contemplar o milagre que se derrama todos os dias, nas minúsculas gotas que transbordam da Tua sublime Criação. Vida que brota nos pés dos transeuntes que percorrem, desenfreadamente, este caminho tão corriqueiro e, ao mesmo tempo, tão desconhecido.

Olhemos para o céu sim, mas não em busca da inteligência, que já está dentro dos nossos bolsos, muito bem guardada e tão pouco utilizada. Mofada. Tomada pelo bolor dos percalços. Busquemos a Sabedoria, que habita as Altas Moradas, e que, por puro Amor, inclina-se dos altos galhos da Árvore da Vida, para se deixar alcançar por nossas pequenas e desleixadas mãos humanas.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Presente

O coração bate forte, acelerado! As mãos suam. A boca seca. Inquietação boa de criança que está prestes a receber o presente que viu escondido no guarda-roupa do quarto dos pais. A hora chegou! O embrulho será entregue.

Corro ao meu assento e finjo que de nada sei. Vejo o Pai aproximar-se com as mãos para trás, escondendo com o seu corpo o segredo que, em poucos minutos, será revelado. Ao lado dEle, vem a Mãe, disfarçando o doce sorriso de quem já sente a Felicidade transbordando das feições do Filho.

Após alguns poucos e compassados passos, dados neste tão longo corredor de esperas que separa o quarto da sala onde estou, os dois finalmente chegam e colocam-se a minha frente. Lado a lado. Serenos. O Pai, com seu Divino sorriso nos lábios, passa o presente a Mãe, que o recebe e já estende, sem demoras, suas humanas mãos em minha direção.

Recebo o tão aguardado embrulho. Pequenino, enrolado em papel azul de forma simples. Azul da cor de um certo Manto. Santo Manto! Com uma fitinha vermelha envolvendo-o. E a cor desta última? Ah, lembra o vermelho vivo do Sangue que brota de um Coração que não se cansa de amar! Detalhes preciosos deste pequeno ato. Caprichos da Divina Simplicidade!

A Felicidade, digna de qualquer criança nestes sublimes momentos, me impulsiona a rasgar por completo o pacote. Rapidamente, à medida que os pedaços de papel voam pelo ar, o que estava escondido vai revelando-se, em raios de uma luminosidade incrível. Tomo então conhecimento do presente! É tão pequeno e tão completo. Tão pedido e tão aguardado. De asas pequenas, penas brancas e brilhantes, eis a minha sublime prenda, chamada Graça!

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Luta

Chamo-me Dom Fulano de La Mancha, o mais excêntrico cavaleiro do Exército de Vossa Alteza! Afamado. Calejado na Divina Arte de derrubar Gigantes! E eis-me aqui, cansado, esbaforido, para pedir-Te: Retirai de mim estas manchas, Senhor! Apartai de mim este sobrenome manchado. Soprai da minha frente estes estranhos gigantes que insistem em triturar minhas esperanças!

Ajudai-me, oh Santo Escudeiro! Os Sanchos se foram, engolidos pelas páginas amareladas dos velhos livros, devoradas pelas traças da realidade. E agora, estes terríveis insetos voltam-se a mim, querendo engolir minhas páginas tão cheias de lutas, consideradas irreais por este mundo louco.

Vou seguindo a pé, Senhor, pois meu pobre alazão também me deixou. E sigo ainda vestido com a Armadura que me deste, apesar desta estar também manchada: Encouraçado de Justiça, cingido com a Verdade, calçado para anunciar o Evangelho pelos mais distantes reinos. Na mão esquerda, o escudo da Fé, na mão direita, a lança do Espírito. E na cabeça, o capacete da Salvação.

Retirai de mim estas manchas, Senhor, mais uma vez peço-Te! E impulsionai-me adiante, oh Brisa suave soprada pelos Santos Lábios, provinda dos Puros Pulmões que enchem e secam sem cessar, em favor da Redenção da Humanidade, neste profundo e contínuo suspiro de Amor, para que eu vença a luta de todas as lutas, a conquista do Céu!

Novelo

Desvelo o novelo e
a novela da minha vida
se desfaz em fiapos,
lançados ao ar.

Fios de ouro,
de prata
e de algodão.

Fios de trapos
e de farrapos.
Fios que caem no chão.

E são recolhidos
e transportados
pelo Vento que vela
os fios desvelados
de tantos novelos,
soltos por este mundo novelesco.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Mil e uma noites

Abre-te, Céu-que-amo! Chegou o ladrão de Bagdá! Ou seria daqui mesmo? Bem, não importa. O que importa é que roubei para mim a vida que Tu me cedeste. Agora, arrependido, nas tuas entranhas quero entrar, para os Teus riquíssimos Tesouros contemplar.

Venho guiado pela doce voz da Virgem, Esposa de Vossa Alteza! Senhora nossa! Xerazade? Não, Cheia de Graça! E venho só, pois os outros quarenta ficaram no caminho. Encantaram-se com os desencantos da vida. 

Vim navegando pelos sete mares, simbadeando os obstáculos e as dificuldades deste mundo. Nada de tapetes voadores. Estes foram puxados dos meus pés, pelas mãos invejosas que buscam derrubar os Filhos andarilhos. E andam voando por aí, buscando outros tapetes para puxar, outros alguéns para derrubar.

E tantas lâmpadas esfreguei em busca do teu Santo Gênio, teu Santo Espírito! Ele que realiza prodígios através da nossa fraca humanidade. Ele que escuta os nossos mais íntimos desejos e realiza apenas aqueles que nos levam a verdadeira Felicidade. Desejos que se adequam a Tua Santa Vontade. Acende a minha lâmpada, Santo Gênio, para que eu seja Luz do Mundo!

Tantas histórias de príncipes e princesas presenciei. Tantas aventuras com mercadores, ladrões e pescadores! Tantas e tantas que me fogem a lembrança, pois longa foi a andança. 

E depois deste imenso percurso de mil e uma noites, eis-me aqui, Abba, às Tuas portas, dizendo: Abre-te, Céu-que-amo, Teu filho quer entrar!

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Ad Verbum

Sim, hoje me disseram não,
e ai de mim se não der o perdão.

Outrossim, não quero reconciliação.
A outros, sim, dou o perdão, e a outros, não.

Porventura sou obrigado
a continuar nesta aventura?

Entretanto, quero continuar,
pois fui escolhido dentre tantos.

E certamente vou prosseguir.
Desta feita, não farei nenhuma desfeita.

Assim, que se faça em mim
o que precisa ser feito.

Ademais, sem alongar mais,
já há desistências demais.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Circuncisão

O Ministério Celestial da Saúde adverte: O prepúcio presente no coração pode causar dores fortes no peito e um profundo e contínuo sentimento de desamor, podendo até mesmo levar à morte. Após esta constatação, comprovada biblicamente pelos primeiros Filhos, diversos Agentes de Saúde foram enviados a Humanidade, para encaminhar os enfermos ao Cirurgião responsável pelo procedimento de remoção do referido entrave. Este processo, também conhecido como Amorização, é gratuito e pode ser realizado a qualquer momento, dependendo apenas da disponibilidade do paciente.

Há diversos testemunhos de pessoas que se submeteram a tal cirurgia e estão passando muito bem. Muitos deles alistaram-se ao exército de Agentes e hoje são disseminadores das maravilhas que o Cirurgião pode fazer. Percorrem os mais diversos caminhos, alcançam os mais distantes recônditos e utilizam-se dos mais diferentes meios para cumprir sua Divina Missão.

Para iniciar o tratamento, é bem simples. Basta dirigir-se a qualquer Posto de Saúde credenciado pelo SUS (Sistema Único de Salvação), seja uma Igreja, uma Capela, uma Comunidade... Ou basta dirigir-se diretamente a um Agente de Saúde. Há sempre um por perto, disposto a ajudar. São facilmente reconhecidos no meio da multidão, pois todos estão marcados com o Sinal da Fé. Caso seja necessário um atendimento mais reservado, basta ligar diretamente para o Consultório, através do número "Em nome do Pai-e do Filho-e do Espírito Santo-Amém!". A ligação é gratuita e pode ser feita a qualquer hora do dia ou da noite.

O Ministério Celestial da Saúde agradece a atenção.
Que o Cirurgião abençoe!

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Escala

* Ao mestre Chico, com carinho.






Doem as chagas
Ressoam as tapas
Mirram-se os ossos
Falta o ar
Solidão
Lado transpassado
Sinistra morte
Dolorosa Cruz
Silencia o mundo
Lamentam alguns
Sol a nascer
Faz-se um novo dia
Misterioso dia
Ressuscita o Cristo
Dominus Dei

E assim, nasceu a escala que os músicos do mundo todo brincam de escalar. E escalarão, alcançando as Alturas, se ressoar em seus corações o compasso da Unção.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Onisciência

Ah, Senhor, como eu queria ter ciência de todas as coisas! Ter o conhecimento de todos os fatos, de todos os atos, de todas as artes, de... Não! Não quero isso! Pois quem tem o conhecimento de tudo, conhece a fatídica hora da visita da morte. Pra quê ter no relógio esta hora marcada? A vida não seria vivida em momentos, em gotas, como deve ser! Ela estaria resumida a uma terrível contagem regressiva. Uma sucessão angustiante de segundos, minutos, horas, dias, meses, anos, vidas. Sim, vidas! Pois eu também teria o conhecimento da hora da partida de todos aqueles que me cercam.

Diante desta constatação, mudo o discurso dizendo: Livrai-me, Senhor, da ciência de todas as coisas! Deixo esta sabedoria suprema a Vós, que é Supremo. Dá-me apenas o discernimento do que é bom e do que é ruim, para que, se for bom, que eu continue e, se for ruim, que eu desvie. Dá-me o conhecimento do que é pecado, pra que eu não venha a pecar. Dá-me o conhecimento do que é Graça, pra que eu não venha a me desgraçar. Eis a onisciência humana, tudo o que nós, Filhos Teus, precisamos. Saber o que é bom e saber o que é ruim. Isso basta. 

Atendei-me, Senhor! Amém!

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Felicidade

Estou feliz, muito feliz! De posse da Marreta do Arrependimento, que estava jogada num canto do meu quarto há tempos, derrubei a enorme muralha que me separava da Salvação. E cada golpe dado, cada tijolo derrubado, era um alívio que meu coração sentia. Como é bom respirar o ar do perdão! E pela força da palavra "Reconciliação", desmoronou, por completo, a antiga construção. Está no chão, seu devido lugar, para ser pisoteada a pés descalços, pelos Filhos da Unção.

E a Felicidade estava lá, sufocada pelos alicerces que desmoronaram. Agora pode dar o ar de sua Graça! Felicidade encontrada em um simples ato. Não foi necessária a aquisição de nenhum bem material. Para sermos felizes, não precisamos de um carro novo, de uma roupa nova, de um sapato novo, enfim, da alegria passageira dos bens materiais. Meros produtos, limitados pela ação constante do tempo, e dos contratempos. A Felicidade Verdadeira é ilimitada. Não se prende a cronologia, nem a dinheirologia. É dom gratuito, disponível a todos que estejam dispostos a rasgar o véu negro das próprias vontades.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Impedimento

Soa o apito abrupto! E mais abrupta ainda é a minha parada. Estou impedido! Tanto treino, tantas horas vividas em busca do melhor condicionamento para bem jogar o que precisa ser jogado e, por conta de um pequeno deslize... Impedimento! Avancei na hora errada. E não foi por agora. O meu avanço aconteceu antes deste momento. Avancei as linhas delimitadoras do pecado, e pequei! 

Agora, de cara para a meta, pertinho, não posso concluí-la. O apito ressoa nos meus ouvidos. Ressoa também na minha boca. Sim, na minha boca, pois o sopro que faz o apito gritar parte dos meus pulmões! Sou árbitro das minhas próprias ações! E mais ainda ressoa a tristeza no meu coração, por não poder fazer parte da lista de artilheiros da Salvação. Meu Técnico deve estar desapontado. Meus santos companheiros de time também.

Nesta partida, partido está o meu coração, pois o zero a zero é o final esperado. Mas não desanimo! Engulo este placar sentindo o gosto do arrependimento. Arrependimento que me levará ao desimpedimento. Quando o centro do campo for apontado pela última vez, sinalizando o fim, correrei ao vestiário para tomar o banho da Reconciliação. E reconciliado, confessado, perdoado, ah, não existirão empecilhos nas próximas partidas! Poderei alcançar a intermediária num segundo, recebendo o primoroso lançamento da Graça, ouvindo o agradável som da torcida pronunciando: "O Corpo de Cristo!" - Responderei com um sereno e vitorioso "Amém!".

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Sentindo (Vontades)

Sentindo vontade de criar,
sentindo vontade de ler,
sentindo vontade de escrever,
sentindo vontade de num sei o quê.

Sentindo vontade de rabiscar,
sentindo vontade de pintar,
sentindo vontade de colorir,
sentindo vontade de descolorir.

Sentindo vontade de correr,
sentindo vontade de parar,
sentindo vontade de sorrir,
sentindo vontade de chorar.

Sentindo vontade de algo sentir,
sentindo vontade de tudo sentir,
sentindo vontade de nada sentir,
sentindo vontade de só sentir.

Sentindo vontade de semear,
sentindo vontade de crescer,
sentindo vontade de florir,
sentindo vontade de amadurecer.

Sentindo vontade de reviver,
sentindo vontade de relembrar,
sentindo vontade de esquecer,
sentindo vontade de apagar.

Sentindo vontade de veranear,
sentindo vontade de nadar,
sentindo vontade de navegar,
sentindo vontade de só ver o mar.

Sentindo vontade de reagir,
sentindo vontade de não agir,
sentindo vontade de sair por aí,
sentindo vontade de ficar por aqui.

Sentindo vontade de me abrir,
sentindo vontade de falar,
sentindo vontade de calar,
sentindo vontade de só ouvir.

Sentindo vontade de não ter vontades,
sentindo vontade de rezar,
sentindo vontade de me prostrar,
sentindo vontade de Adorar.

Sentindo vontade de tomar um café,
sentindo vontade de me levantar,
sentindo vontade de não mais escrever,
sentindo vontade de parar por aqui...

O café tá esfriando!

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Caverna

Tem alguém aí? - Perguntam lá do lado de fora. Claro que tem, penso eu daqui dos fundos, onde me escondo do mundo para hibernar por um tempo. Estou aqui para dormir o sono do descanso, fugindo das obrigações e mesmices do cotidiano. Vim por conta própria. Não fui soterrado pela avalanche de hormônios e sensações que tanto atormentam os corações depressivos.

Não, não há uma enorme pedra fechando o recinto. Nem tão pouco um muro erguido do chão ao teto, com uma pequena entrada de ar e luz no topo. Não! Minha caverna é fechada à porta de madeira. E a chave está no meu bolso, atada a um chaveiro em forma de cruz. Também não estou preso aos grilhões platônicos. Posso mover-me livremente por todos os cômodos. E há Luz! Sim, Luz! Cavernas alegóricas só para os filósofos! A minha é diferente! Lar doce lar, que me abriga nos rigorosos invernos da alma.

Também não estou morto, atado a faixas, como pensam alguns. Estou vivo, pulsante! E o Amigo, desta e de todas as horas, que antes estava no lado de fora, entrou e sentou-se a minha escrivaninha. Juntos, estamos escrevendo alguns textos, tomando como base as emoções pretéritas que retiramos do baú que enfeita a sala. Matéria-prima para criações. Sim, pretéritas, pois as futuras ainda não existem! Não se faz lenha de árvores que ainda não nasceram! E o presente é agora, e por agora estamos tomando um cafezinho. Quem sabe, depois do café, não iremos escrever um texto sobre a prosa deste momento?

Ah, e quando o inverno passar e o Sol derreter a densa camada de neve, sairemos com cestos abarrotados das sementes que surgiram nos fundos da caverna, resultado das longas e frutíferas conversas que tivemos nesta fria e solitária temporada invernosa.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Espetáculo

Respeitável público! Está em cartaz, o maior Espetáculo da Terra! E não é de agora! Há muito está disponível em todos os teatros, cinemas, circos, praças, ruas e lares. Nos mais impenetráveis recônditos da alma humana. Nos mais iluminados palcos da arte contemporânea!

Há milhares e milhares de ingressos disponíveis nas bilheterias. Em quantidade suficiente para não deixar ninguém de fora. E são gratuitos! Pessoais e intransferíveis. Sim, são nominais! Se um amigo ou um familiar quiser, terá que vir buscar o seu respectivo. Convide-os! Além do Espetáculo, a entrada dá direito a um Banquete, com lugar ao lado do Protagonista. E não há filas, infelizmente! Ultimamente, as pessoas têm se afeiçoado a outras “artes”. Uma pena!

Há tantos atores! Há um Rei, que desce do seu Trono e faz-se igual aos seus súditos. Há uma Mãe, doce Mãe, que conduz todos os outros artistas aos braços do Soberano, seu Filho. Há muitos príncipes e princesas espalhados por todo o cenário, buscando um encontro pessoal com o Monarca. Há aqueles que não O buscam, pois se dão a outras paixões. Há também você e eu! Sim, podemos participar diretamente do Espetáculo! Diria até que a nossa participação é fundamental! Mas só se você quiser, claro. Ninguém é forçado a nada! Há ainda aqueles que querem atrapalhar o andamento da Peça. Antagonistas das Divinas Artes. Não vale a pena falar deles! Já possuem audiência demais!

E então, o que está esperando? Vamos? Há muitos lugares vagos na plateia. E não precisa levar muita coisa. Basta o seu coração. Deixe suas faltas, seus erros, sua vida velha. Fica tudo do lado de fora. Dinheiro, pra quê? Também fica para trás! A pipoca é de Graça! Isso mesmo, Graça! E se quer saber o horário da próxima sessão, pode ser agora, se você quiser!

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Carroça

Fome, miséria, violência, doenças, catástrofes. Eis a carroça de desgraças que assola a humanidade e a reduz a pó! E desiludidos, cansados e perdidos, perguntam os homens, com o peito cheio de razão: Por que Deus não freia este carro?

Ah, tantas perguntas a se fazer! Mas a acusadora questão de sempre invade os pulmões tuberculosos e explode num rompante: “Por que, Senhor?”. Pergunta que, direta ou indiretamente, atribui a Deus uma culpa que não é dEle. Nós e o nosso encardido vício de buscar nos outros a culpa que, quase sempre, não é dos outros. É nossa!

Mas enfim, por que mesmo Deus não pára esta carroça? Tomo aqui a liberdade de responder tal questão com algumas outras, para não fugir da esperada reação de um homem, posto que também faço parte desta humanidade: Deus tomaria de volta um presente dado aos homens? Seria esta uma atitude digna dAquele que é só Amor, o mais Puro Amor?

Caros irmãos, Ele, nosso Divino Criador, deu a nós uma charrete, chamada Livre-Arbítrio, para que pudéssemos enchê-la com coisas boas. Mas, infelizmente, fazemos mau uso desta dádiva. Por amor a nós, despiu-Se de sua condição de Onipotente para nos presentear com o poder de agirmos livremente. Um poder que só um Pai pode dar a um Filho.

Portanto, não são cavalos divinos que puxam este carro. São cavalos terrenos! São homens que matam os seus de fome. São homens que disseminam a miséria entre os homens. São os homens que produzem as armas, as drogas e todo o tipo de lixo destruidor. São homens que concentram o poder e o conhecimento nas mãos de poucos e privam os demais dos avanços da Ciência e da Medicina. São os homens que disseminam os desentendimentos, as desavenças, as desilusões, as desgraças. O “des” não vem de Deus. A Graça sim, é Fruto de Suas Mãos. E não quero imaginar o quão triste Ele fica diante de tal postura nossa. Para que possa atingir um Ser Infinito, deve ser uma tristeza profunda!

Ah, Senhor, perdoai-nos! Ocupados com as humanas artes de acusar, questionar e acelerar, nos esquecemos das Divinas Artes de Assumir, Solucionar e Frear.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Rosa

Bendita a hora que tu foste embora, tenebrosa Rosa! Saiu com tua trouxa de vestidos vermelhos despetalados e tomou o primeiro cometa desgovernado que por nossa porta passou. Foi-se desgovernada, esvoaçante, desgovernar outras vidas que, desavisadas, encantaram-se com tua efêmera beleza. Ah, se conhecessem a Verdadeira Beleza!

Saiu com tanta pressa que nem sequer lembrou-se de trancar o cadeado. Deixou minha vida e meus pertences escancarados. Já pensou se o ladrão resolve visitar meu lar, desleixada Rosa? Há agora tantos ladrões por estes confins! Já pensou se roubam um dos meus vulcões?

E a pobre borboleta? Por que tu não te despediste dela, ó indiferente Rosa? A pobrezinha veio prosear contigo pela manhã, como faz de costume, e encontrou tua redoma vazia! Quase teve um passamento, a alada criatura. Nem tuas amizades tu valoriza, inimizada Rosa!

Ah, cruel vegetal, e se achas que, por ter se ido, deixou no meu peito um coração ferido, eu novamente te digo: Bendita a hora que tu foste embora! Pois agora irei reorganizar os sentimentos e sensações que estavam misturados nos caldeirões das tuas vontades. Vou reerguer o altar que estava no chão, utilizado para adubar o teu colchão, e colocar sobre ele a Verdadeira Razão do meu viver.

E se um dia eu te ver por aí, pretérita Rosa, te apresentarei Àquele que encontrei enquanto mergulhava nesta dolorida arte de transformar dor em Arte. Ele que me mostrou que não sou só um Pequeno. Sou um Príncipe, filho do Rei, filho do Pai!

Escada

Nesta
escada
que
desce
das
Alturas,
vem
a
Unção
que
brota
das
Divinas
Mãos,
até
chegar
ao
homem
que,
por
desleixo,
maldade
ou
excesso
de
preocupação,
deixa esta Suprema Graça espatifar-se no chão. E no chão permanece até que vem o menino, brincando de peão, recolhe os cacos, coloca no bolso e vai-se embora com a Divina Inspiração. Cresce, vira gente e torna-se escada para todos os cristãos.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Estação

Eis-me aqui, numa destas estações da Vida, aguardando, ansioso, a chegada do Trem da Felicidade. E com o meu fiel companheiro atado ao braço esquerdo, marco o tempo da espera. Relógio que exibe em fatias a ânsia do novo, fatiando também o meu coração já em pedaços.

Olho para o Nascente, na esperança de enxergar o mínimo sinal da fumaça branca que brota da chaminé da sonhada locomotiva, mas nada. Nada além de uma revoada de pássaros ao longe, migrando para o Sul, escapando do vento frio do inverno que se aproxima. Inverno que já me alcançou, fazendo cair minhas folhas, esfriando minha alma, encharcando minhas alegrias, afogando meus sonhos. Pelo aspecto das aves, diria que são garças. Ah, e quem dera fossem Graças e migrassem para o meu coração! As Graças que um dia pedi e que ainda devem estar no Alto de Sua Morada, aguardando a divina hora de Sua revoada, hora que desconheço e que não pode ser marcada pelos relógios humanos, pois não os obedece.

Falando em horas, há tantas aguardo. Nesta estação, onde estacionou o meu coração, parece que o tempo também estacionou. E estacionados estão os meus braços, cruzados sobre o meu peito. Estacionadas estão minhas pernas, cruzadas sobre o banco estacionado. E estacionado estou por completo, quando o cochilo avança sobre os meus olhos e estaciona em mim, arrebatando-me de minha consciência. Logo se torna sono, e sono profundo! Tão profundo que não escuto o apito do Trem que ecoa em badalos, anunciando, finalmente, a sua chegada.

E eis que chega, puxando o vagão repleto de lenha viva, utilizada para inflamar a fornalha das mais baixas autoestimas. Além deste, muitos outros vagões também são puxados, cheinhos, abarrotados de felicidades. Pedidas e não pedidas! E para à minha frente, apitando com estrondo! Não acordo. A cobradora, chamada Esperança, salta do trem e tenta, docemente, me acordar. Não acordo. Ela insiste, calma, doce, maternal. Não acordo. Adentra a locomotiva. O Maquinista, paciente, também salta do trem e me chama pelo nome. Não acordo. Dirige-se à cabine e soa um último e estrondoso apito. Não acordo. Parte então seguindo os trilhos, rumo a outras estações.

Enfim, acordo. Olho novamente para o Nascente, e nada. Olho para o Poente e vejo, longe, o que parecem ser traços de fumaça branca expelida por um trem. Mas não deve ser, penso eu. Se o Trem tivesse passado, eu o teria visto. Devem ser garças voando rumo ao Sul.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Dor aguda não identificada

Que dor não identificada é esta que sinto, ó Deus meu? Dor que não escolhe membro e nem nenhum órgão humano concreto, talvez para escapar dos efeitos paliativos ou definitivos das medicações. Dor que desponta num repente, nascida talvez de um turbilhão de sentimentos e sensações não tão repentinas, mescladas no caldeirão secreto do inconsciente e liquidificadas nos movimentos constantes do liquidificador do consciente.

Será a louca Depressão, que ora foge do hospício dos transtornos, arrebentando a camisa de força da mente para vir atormentar-me com seus berros e gritos silenciosos? Ah, triste herança familiar! És tu, desvairada? Identifique-se! 

Será o prussiano soldado do Combate, armado com sua espada e seu escudo torpes, que ataca a alma e toda a matéria que a envolve? Aparta-te de mim, ó militante do partido da tristeza!

Será o Cansaço humano, que chega de braços dados com a sua esposa, a chamada Estafa? Ó infeliz casal minador das mirradas forças do homem! Não quero fazer parte de um triângulo desanimadoroso!

Será a união destas três mazelas, que se juntam para formar o terrível exército do esmorecimento e marcham desenfreadamente em busca de corações para devorar, mentes para embaçar e crenças para dissipar?

Independentemente de quem é ou de quem são, sei o que fazer! Que venham as mais diferentes causas de desalento, enfrentá-las-ei! Amarrá-las-ei nos braços da Unção e transformá-las-ei em texto. Com todas as palavras, vírgulas e pontos necessários! Quem sabe assim não faço essa dor sucumbir através dos corações e orações daqueles que lerão tais palavras, pela força da comunhão dos santos? Roguem por mim, santos corações, para que me desenlace deste laço que ora sinto, que ora transformo em palavras, que ora estão a ler.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Santa Casa

* A Casa Mãe da Comunidade Recado - conheça esta Vocação: http://comunidaderecado.com

Olha a casa, casa santa, onde Deus fez Sua morada - assim diziam as velhas cantigas dos dias de Reis de minha infância. E quem diria que um dia eu viria topar numa destas santas casas. Santa Casa das mil e uma misericórdias, que me acolheu quando eu atravessava um dos períodos mais complicados de minha vida. Quero louvar e agradecer, porque Você, Senhor, me trouxe até aqui!

Casa de um certo Francisco, de uma certa Teresa, baluartes da Vocação das Belas Artes. Casa também de uma certa Das Graças, que com o seu véu branco e manto azul, debaixo do sapotizeiro, acolhe todos aqueles que chegam pronunciando a famosa jaculatória: “Ó Maria concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a vós!”. Rogai por nós, ó Santa Mãe de Deus! Ela que também se encontra aos fundos, no seu cantinho, quietinha, acolhendo tantas preces e palavras que se dão em seu derredor, nos acompanhamentos, formações, no coro grave do Terço dos Homens, nos encontros dos grupos de oração. Ela que contempla, todos os dias, a Cruz do seu Filho posta no alto da torre branca visível de seu posto, fazendo referência ao dia da dolorosa Paixão de Nosso Senhor. Torre de onde ecoa, através de badalos, a voz dEle, chamado os fiéis ao seu compromisso, confirmando as divinas moções do Espírito.

Casa de um tal Jesus! Ah, esse tal Jesus, que rasga os véus de tantos corações empedernidos. Jesus que não se encontra apenas na Capela, escondido no Sacrário ou exposto no Ostensório. Encontra-se em toda a casa, nos oferecendo os pés de Sua Cruz, pra sermos lavados por seu Sangue Redentor. E quão bela é a imagem de Seu precioso Coração, que está sempre aberto, oferecendo o repouso a todos aqueles que estão cansados, sem lugar para descansar.

Casa de um pátio enorme, onde ocorrem as Celebrações Eucarísticas, onde ocorrem os momentos comunitários, os Seminários de Vida - porta de entrada para muitos corações desejosos de um encontro pessoal com o Anfitrião. Onde, enfim, podemos dizer a uma só voz: Elegemos-Te Senhor, como nossa riqueza, em Ti está o nosso coração. Nossa Herança, nossa Fortaleza, nossa Vida e Salvação. Bendito seja o Senhor por esta casa!

Casa de tantas salas, de tantos ministérios, de tantos grupos, de tantos projetos e obras. Divinas Obras! Casa de tantos filhos e filhas que lutam dia a dia buscando a santidade, em meio aos percalços do mundo. Pastores, intercessores, músicos, cantores, atores, atrizes, circenses, escritores, pintores, escultores, fotógrafos, artistas que ainda não encontraram sua arte, pessoas especialistas na difícil arte de viver. Frutos do Divino Artista, ministros do Louvor e da Alegria, consoladores do Sagrado Coração, unidos para anunciar a Glória do Cristo Ressuscitado e para sempre, sempre dar o Recado que vem dos Céus! Ó bendita casa! Santa casa! Casa Mãe, casa Pai, casa do Pai!

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Imagem

Acordei cedo. Ela também. Meus olhos, ainda pesados de sono, prendiam-me a cama. E ela, também presa, com os olhos também pesados, retinha-me. Levantei-me num salto, vencendo os seus braços. Banho, roupas, café da manhã e logo já estava pronto para mais um dia de trabalho, de lutas. E ela também.

Saímos juntos, como sempre. Ambos no carro, calados, ouvindo o mesmo som de todos os dias. Som do som, som do trânsito, som das pessoas na rua. Um breve momento de oração, antes da chegada ao trabalho. Uns seis quarteirões antes, pra ser mais preciso. Um Vinde Espírito Santo, um Pai Nosso, uma Ave Maria e um Santo Anjo do Senhor. Rezamos juntos, mais como um compromisso do que como uma reza de fato. E de direito! Momento mecânico, muitas vezes. Raramente vem do coração. Estacionando, dizemos o "Oh Maria concebida sem pecado". Já fora do carro, vem o "Coração Divino de Jesus, providenciai!". Providenciai! E como enchemos o peito para pronunciar isso! Cheios de razão!

Dia difícil. Eu correndo de um lado para o outro. Ela, também. Esbarramos-nos em alguns momentos, mas nada de interações. Somente ações. Ligações, reclamações, discussões. Estresse. Entardece. Anoitece. Hora de ir embora. Encontramos-nos no carro. Nenhuma palavra. Apenas uma troca singela de olhares e um sorriso amarelo. Seguimos. Passando por uma capela, lembro que aquele era dia de Adoração. E qual não é? Reduzo a velocidade, procuro parar. Não, vamos para casa! - Clama ela quebrando o silêncio que imperava. Estamos cansados, exaustos, não temos tempo pra isso. Sou vencido, não reajo. Apenas obedeço a vontade que se sobrepõe a necessidade.

Chegamos ao lar. Banho, pijamas, jantar. A televisão grita, como se fosse a dona da casa. Cospe sobre nós todas as mazelas deste mundo. Levanto irritado. Desligo o eletro indomesticável com rapidez. Contra a vontade dela. Meu coração está inquieto, agitado. Decidido, resolvo quebrar o gelo entre nós. Ponho-me diante do espelho e inicio uma longa conversa, uma longa reflexão: Ah, Imagem cheia de vontades, cheia de quereres, cheia de si! - Assim comecei minha explanação. E após muitas lágrimas, soluços e véus rasgados, tomamos posse da Graça que há muito estava esquecida: Somos filhos do Alto! Ela, a minha Imagem refletida no espelho, e eu, pobre cristão, somos Imagem e Semelhança dEle, que estava de lado neste texto - e nas nossas vidas - até então. E Ele, ah, Ele! Sem Ele, não seríamos imagem, não seríamos semelhança, não seríamos espelho, não seríamos nada.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Aliança

Olhou-me nos olhos e disse sorrindo: Recebe esta Aliança, como prova do meu Amor! Dei as costas e lentamente me dirigi à porta da frente. Nem sequer ouvi o pranto que se desdobrou. Lá fora, a Liberdade aguardava-me montada num lindo cavalo branco. Num salto, montei, e após um alto grito de "Avante!", corremos desenfreadamente pelo mundo.

A vida foi passando, o cavalo foi cansando, definhando, atrofiando, mirrando, morrendo. A Dona Liberdade, antes a mais bela de todas as princesas, embriagou-se com os vinhos doces do tempo e tornou-se a mais insuportável de todas as megeras. Andava despenteada, usando vestidos encardidos. Banqueteava-se com antidepressivos, antiamigos, antifelicidades. Desfigurada, desequilibrada. E desequilibrada estava quando abriu a porta do barraco onde morávamos e saiu correndo em busca da manada de cavalos brancos que disse ter visto passar. Nunca mais voltou.

Fiquei sem chão. Saí pelo mundo, vago, vagando, divagando, devagar. Sem comer, sem beber, sem falar, sem amar. Sem nenhum verbo que pudesse me valer. Preso às cadeias deixadas pela Liberdade. Solto nesta terra de tristezas e crueldades. Vaguei até perder completamente as forças e desmaiar à sombra de uma antiga construção.

Acordei com um estrondoso badalo. Olhei para cima e vi uma cruz no alto daquele prédio. Reconheci o local. O cinzento cavalo da desilusão me trouxe ao mesmo lugar onde, naquele dia infeliz, montei no alazão da Liberdade. A porta estava aberta. E cansado, sofrido, desiludido, mas decidido, entrei. E Ele estava lá, de pé, na mesma posição que estava quando O deixei. Então rasguei o meu coração dizendo: Senhor, eis-me aqui, pra receber a Aliança que naquele dia recusei. Apaga as minhas faltas, enxuga as minhas lágrimas, acolhe as minhas lástimas. Olhou-me nos olhos e disse sorrindo: Recebe esta Aliança, como prova do meu Amor!

terça-feira, 26 de julho de 2011

Sementes

Caminho com dificuldade. Não devido às pedras e os espinhos que encontro na estrada. Mas devido ao grande volume que se encontra em meus bolsos. São sementes. Muitas sementes! Todas trazidas lá do Celeiro, onde há sacas e mais sacas de sementes. Uma fonte inesgotável de sementes. Uma riqueza sem fim!

Constantemente vou lá. Encho os meus bolsos e saio por aí, a semear. É a minha função. Minha missão. Carrego tanto os bolsos que fico assim, cambaleante, lento. E à medida que vou andando, vou lançando-as nos campos, uma a uma.

E são sementes de todos os tipos. Não as escolho. Algumas se tornam poemas, que crescem, crescem e tomam toda uma folha de caderno. Outras, de tão poéticas, não se contentam apenas com folhas de papel e ganham os ares. Tornam-se músicas. E embora seja redundante, é bom frisar que se tornam músicas com poesia! É, tem que ter poesia. Música sem poesia é como pirão sem farinha, não passa de caldo! E caldo sem tempero. Água e sal, como uma bolacha, que só enche bucho, não alimenta! Encher ouvidos não basta! Tem que preencher corações! Outras, levadas pelo vento aos mais distantes palcos, tomam forma e tornam-se esquetes, peças. São sementes teatrais que encantam, antes, os corações dos divinos artistas, para depois encantar os corações espectadores.

Há também aquelas que não foram semeadas, infelizmente. Talentos enterrados nos bolsos do esquecimento e do desleixo. Secaram com o tempo. Somos falhos. Uma ou outra se perde. E o mais duro é saber que um ou outro coração também pode perder-se porque não recebeu aquela determinada semente. Mas não devemos desanimar. Devemos aprender com os erros e confiar na Misericórdia do Dono do Celeiro.

E quando as sementes findam e os bolsos estão vazios, ah, agora sim! Posso correr livremente! Mas não corro! Não nasci para ficar correndo por aí! Dirijo-me ao Celeiro em busca de novos grãos. E já estou precisando de um novo uniforme de trabalho, com bolsos maiores. Há muitos poemas para escrever, muitas músicas para criar, muitas peças para formar, muitos campos para plantar, muitos corações a alcançar.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Revolução

Chegou a hora! Vamos começar a Revolução! Convoco todos os soldados a tomarem suas armas: lápis, papéis, tintas, telas, vozes, instrumentos musicais, malabares, perucas, narizes, maquiagens, figurinos e esquetes. E não esqueçam o arsenal principal, pois a revolução é mundial e irá atingir o nível nuclear, secular: Missa, Adoração, Bíblia, terço, confissão! Joelho no chão! Revolução nuclear para alcançar o núcleo dos corações empedernidos.

Vamos invadir os palcos, tão cheios de estrelas e vazios de Arte. Vamos renovar os discos, tão cheios de músicas e vazios de Música. E falando em música, queridos músicos, vamos arranjar meios de criar novos arranjos. Chega dos desarranjos auditivos, das diarréias sonoras! Chega das mesmas letras! Há tantas no alfabeto! Caros poetas e letristas, Jesus não rima apenas com Cruz, com Luz. Basta de rimas pobres! Poema tem que ter poesia, senão é só mais um texto! Jesus rima com tanta coisa! Jesus rima com Arte! Dançarinos, menos corpo, mais Espírito!

Circenses, é hora de rasgar as velhas empanadas! É hora de se deixarem molhar pela chuva de Graças que não cessa de cair!

Malabaristas e equilibristas, chega de andanças na corda bamba! Chega de desequilíbrios! O bom mesmo é seguir em frente, andando em linha reta. Chega de olhar para baixo. Olhem para o Alto! Busquem o Alto! Não fiquem balançando da direita para a esquerda, da esquerda para a direita. O caminho que leva ao Céu é estreito, mas é reto. Lancem para cima, junto com os malabares, todas as suas preocupações, tristezas e angústias. E caso venha a cair algo no chão, não se desesperem. Há sempre uma nova chance! Um novo picadeiro, um novo público! Respeitável público! E pirofagia só fica bonito quando o fogo vem de dentro, literalmente! Fogo do Batismo! Línguas de fogo!

Trapezistas, subam, subam o mais alto que puderem! Corda, tecido, não importa! Quanto mais alto, mais lindo fica o show! Mais linda fica a Vida! Vida em abundância!

Ah, e quanto a vocês, Palhaços? Haverá ofício mais nobre do que o vosso? O de fazer Graça? Divina missão! Acho que Jesus voltará como um de vós! Se é que já não anda por aí, arrancando as mais libertadoras gargalhadas!

Povo do Teatro, salve, salve! Chega de astros e estrelas! Não somos astrólogos! Energia positiva só na tomada! E cuidado com o choque! Energia boa é a que vem lá de cima. E quebrem a perna: da soberba, do egocentrismo, do orgulho!

Vamos fazer como o nosso Criador, o Artista Mor! Vamos pintar o sete em sete dias e criar um mundo novo, repleto de Arte e de Amor. E para isso, vamos abrir o tão esquecido Baú de Criatividades, chamado Espírito Santo, com o auxílio, o Louvor e a Alegria de Maria, que é a maior de todas as coadjuvantes, protagonista do maior de todos os esquetes que o mundo já viu: A Salvação. E vamos à Revolução!

sábado, 23 de julho de 2011

Encontro


Na ânsia do Divino Encontro,
alcanço o desencontro
e me canso porque não encontro
Aquele que me encontrou.

E encontrado sem encontrar,
não encontro meios de encontrar,
pois procuro, nos desencontros,
o que se encontra no meu amar.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Saudade

Encontrei numa velha gaveta, uma velha palavra chamada "Saudade". E que dor no peito este achado me deu! Eu e a minha velha mania de procurar as velhas coisas esquecidas nas velhas gavetas! Quem me dera ter achado outra palavra: "Amizade", "Bondade", ou quem sabe a tão sonhada "Felicidade"! Revolver a gaveta das "ades" dá nisso.

Com extrema rapidez, tentei devolver a referida palavra ao seu lugar, mas já era tarde! Dei as costas a gaveta e senti saudades da "Saudade". Ela age depressa! Penetra a pele, cai na corrente sanguínea e, em milésimos de segundos, aloja-se no coração. E quem sabe se não é neste último o seu devido lugar? Acho que "Saudade" não combina com gavetas. Bem, não sei, mas me disponho a pesquisar. E para auxiliar minhas pesquisas, ando coletando "Saudades". Já tenho um frasco cheinho delas, branquinhas, inquietas, lacrimejantes. Já tenho até um local de trabalho! Chama-se "Vida". E todos os dias, neste laboratório, sei que encontrarei as condições ideais para o meu estudo. Talvez, ao final das minhas descobertas, eu receba um Nobel! Ou talvez receba apenas algumas lágrimas, alguns apertos no peito, alguns... Quem sabe?

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Encanto

Lá no vale do encantado,
o encanto desencantou,
quando se encantou com o Alto
e para o Alto se voltou.

Descobriu que lá no Alto,
vive o verdadeiro Encanto.
E hoje canta para o Encanto
que lá no Alto encontrou.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Alto



Subi ao alto cume
da montanha mais alta,
em busca do Perfume que exala
do alto das nuvens mais altas.

Procurava nas alturas
um altar pra Te respirar
e estavas bem aqui, tão Alto,
nas alturas do meu pensar.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Amigo

De braços dados contigo,
querido amigo,
enfrento o tenebroso abismo,
para os incautos, um atrativo.

Após um profundo suspiro,
o salto eu arrisco,
no rosto um sorriso
e no peito um alívio.

Descubro que voar eu consigo,
com as asas do amigo,
por cima do perigo
e das garras do inimigo.

Na direção do Infinito,
no ar eu prossigo,
com o coração tranquilo
nas asas do amigo.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Discernimento (Quebra-cabeça)

Muitas peças sobre a mesa,
frutos das Mãos da Suprema Beleza.
Nada que impeça uma humana proeza,
com o Auxílio Divino da Divina Esperteza.

Uma passagem, uma música,
uma Missa, uma reza.
Minúsculas gotas da Infinita Represa,
derramadas em doses de sagrada clareza.

E de posse de tais singelas surpresas,
plantadas por Vossa Magnífica Alteza,
aqui prosseguimos, quebrando a cabeça,
até que a Graça desça e a Verdade enfim apareça.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Loucura

Atenção! O Louco está à solta! E vem despejando loucamente água e sangue que jorram, incessantemente, do seu Louco Coração transpassado.

Fujam, fujam ao encontro dEle, o mais rápido que puderem! Corram! Não sejam loucos ficando exatamente onde estão! Não há loucura maior do que a de permanecer estancado em uma vida de loucuras! Desviem das loucas e barulhentas sirenes das ambulâncias encardidas que tentam barrar este louco encontro!

Corram, corram! Por que ainda estão aí parados, lendo? Já não estou mais aqui escrevendo estas palavras! Já foram escritas! Por agora, estou nos braços dEle! Já corri! Fugi! Fui ao encontro dAquele que saiu do hospício da vida e adentrou no Divino Hospício da Eternidade, rasgando para sempre a negra camisa de força da morte. Levantem-se!

E quando acharem-nO, abracem-nO, beijem-nO, adorem-nO! Oh, Santa Loucura! Aprendam com Ele a louca arte que é o Amar!

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Resistência

Chegaste mais uma vez, oh Noite, e faz tão pouco tempo que tu embora foste.

Logo agora em que me banhava com o Sol, sem nenhuma proteção, pois queria enfeitar-me com a mais pura Insolação.

Por que voltaste tão rápido, oh deserto tão árido?

Se foi por saudades minhas, saibas que saudades de ti não tinha.

Se foi para educar-me, saibas que estou de férias e não quero por agora estudar.

Se foi para namorar-me, sinto muito, já estou enamorado, procure um outro par.

E se foi para escurecer-me, desculpe, volte outro dia. E volte de dia, para que o Sol possa conhecer-te.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Voz

Que Voz é essa que vive dentro de mim?

Cria-me, Voz, pois és a única Voz que pode, pela Força de Tuas Palavras, do nada tudo criar.

Forma-me, quando do nada me tiveres tirado e em estatura, Sabedoria e Graça faz-me crescer.

Canta e encanta o meu ser que já não canta, pois se encantou com os cantos que impedem de a Ti cantar.

Fala ao meu desenfreado querer todas as Bem-aventuranças que provêm do Teu supremo Querer.

Grita e ecoa pelas cavidades ocas da alma que insiste em preencher-se com o nada que a vida com "v" minúsculo teima em oferecer.

Cala-Te diante das minhas faltas, pois o Silêncio de Tua desaprovação é o deserto que preciso viver para voltar a Te escutar e Te obedecer.

Chama-me, quando o doce som de Teus Santos Lábios eu voltar a ouvir.

E quando enfim voltar a Te ouvir, no baú dos teus verbos vou querer mergulhar, para buscar o "Viver", o "Criar", o "Formar", o "Crescer", o "Cantar", o "Encantar", o "Contemplar", o "Ser", o "Falar", o "Querer", o "Gritar", o "Ecoar", o "Preencher", o "Oferecer", o "Calar", o "Escutar", o "Obedecer", o "Chamar" e o tão sonhado "Guiar". E ao encontrar este último, guia-me, Voz, ao Verbo que se fez carne para nos ensinar o Verdadeiro e único sentido do divino verbo "Amar".

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Mudança

Cansado de uma vida de andanças
e deste imenso redil de inseguranças,
declaro aos regentes desta dança: estou de mudança!

Ponho nas costas a mochila da esperança,
carregada com minhas melhores lembranças
e com uma sutil e inexplicável Confiança.

Parto em busca de uma herança
que sei, tenho direito, desde a mais tenra infância
e que não é só mais um sonho de uma sonhadora criança.

Lanço-me no caminho que quase ninguém se lança
por medo, orgulho ou falta de temperança
ou por qualquer outro motivo que me foge a lembrança.

E eis que surge, em forma de Homem, a referida Confiança
trajando um manto branco, portando um cajado e falando bem calmo:
Quero restabelecer contigo uma antiga Aliança!

Fitando-me nos olhos, continuou a falar:
Eu Sou o que Sou, eterna Bonança, infinita Segurança
e tu és a minha tão sublime Imagem e Semelhança.

Esqueça, a partir de agora, os antigos versos,
as velhas estrofes e as más palavras que te afligem ainda.
Na poesia da tua Vida, deixa que Eu faço a rima:

Vou te guiar a um Lugar,
sua morada lá será,
siga os meus passos e juntos vamos chegar.

Chamando-me pelo nome, pôs-se a caminhar
e eu, ouvindo a Sua Voz, deixei-O me levar,
como uma ovelha, tão dependente, ansiosa para pastar.

Enfim, chegamos ao tal Lugar. Deixando-me descansar, pôs-se a falar:
Meu filho, aqui não há dor, não há temor, não há desamor.
Aqui, minha querida ovelha, é o coração do Bom Pastor!

terça-feira, 21 de junho de 2011

Volta


Voltando de uma das voltas das loucas voltas que a vida dá,
volto-me Àquele que está sempre voltado para os filhos,
sem importar-se com as tresloucadas voltas que voltamos a dar.

E nesta reviravolta em que volto a viver com o Cristo envolto,
deixando de viver uma vida de revoltas,
volto a sonhar com o dia da minha volta à Divina Casa, para de lá nunca mais voltar.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Ama

Ave, plena da Unção,
digo eu que não sou um anjo,
mas admiro a tão sagrada Saudação!

Ama de leite dos Filhos do Alto,
livrai-nos dos percalços deste mundo de muitos laços
e conduz-nos aos Braços do nosso Cristo, teu Regaço.

Ama que ama e que,
de tanto amar, deixa de ser uma simples ama
e torna-se a Mãe que tanto ama. Eis aí a nossa Mãe!

Ventre da Unção,
Morada santa do Divino Embrião,
Berço solene da nossa Salvação.

Ave, plena dos mais sublimes Apelidos,
Nossa Senhora, Cheia de Graça, Onipotência Suplicante,
Virgem Mãe, Mãezinha do Céu, Mãe, Maria de Nazaré, Maria de todos nós!

domingo, 19 de junho de 2011

Parque de Emoções

Deitado sobre o colchão de emoções,
ergo os braços aos céus e tento puxar as nuvens como se fossem doces algodões,
prontos para adocicar as infantis aspirações.

Mas não são os algodões que minha alma infante realmente anseia,
e sim a Eterna Doçura
que está por sobre a Celeste areia.

Corro para o carrossel das ilusões e,
nas voltas que ele dá, caio dos belos alazões
desprovidos de arreios e das demais sustentações.

E desviando do restante da manada,
subo a russa montanha
buscando uma visão privilegiada da Santa Morada.

Mas quando atinjo o cume, carros alucinados me lançam ladeira abaixo,
fazendo loucos traçados, deixando-me enjoado,
com a vida de cabeça para baixo.

Vejo então, com olhos de criança, 
a gigante roda e animo-me,
pois me faz lembrar a eterna Aliança.

Tomo então assento na referida estrutura
e rapidamente alcanço
as sonhadas Alturas.

Mas com raiva então eu choro
quando a roda roda
e ao solo eu retorno.

E ainda aos prantos,
a dolorida pergunta eu lanço:
Por que o Céu não alcanço?

Eis que surge o Dono do Parque,
com o rosto pintado, nariz de palhaço, em cada mão um buraco
e falando aos bocados:

Querida criança,
não perca a Esperança,
a vida é uma dança!

Tome o meu Braço,
segure o meu Laço,
siga os meus Passos.

E não se apresse.
Pra mim, o tempo não fenece.
Faça sua prece, ajude o que carece, ame o que não merece.

Assim, verás o Céu que não escurece,
o Parque que ninguém esquece
e a Vida que nunca envelhece.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Chuva

Acompanho com espanto e admiração a aproximação da massa de nuvens cinzentas, carregada pelo Vento leste que sopra forte e impetuoso.

Escoltada por raios e trovões, a imensa e escura carruagem, num ritmo galopado, toma o Céu de uma ponta a outra, pondo o Sol às suas costas, escondendo-O de toda a humanidade. Pelo menos de toda aquela humanidade que habita a minha rua!

Voando voraz vem o Vento e logo tudo o que é "v" vira "f" fazendo as folhas das figueiras farfalharem com força num fantástico fffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffffff.

O Sol, cocheiro oculto da massa de nuvens, toma o trovão como microfone e solta sua poderosa voz: Eis o meu Filho muito amado, em quem pus toda minha afeição! Provai-O! Despenca então dos Céus o Filho em forma de gotas, derramando-se por completo para lavar da terra todas as nossas sujeiras.

Tomando total consciência do fato e tendo a real compreensão de todas as coisas, corro feliz a minha casa, escancaro a porta da frente e grito: Está chovendo Graça!

Rapidamente, com baldes, tambores, cabaças e outras aparaduras, toda a vizinhança põe-se na rua, pulando, brincando, dançando e fazendo firulas. E a você, que teme as nuvens escuras, deixo a seguinte pergunta: Vamos tomar banho de Chuva?

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Colo

Na noite fria e sem consolo,
corro em busca do teu colo
e deito sobre ele a alma que arde após o dolo.

Na teia das culpas caio como um tolo
e, atropelado pelas emoções em rolo,
sou tomado pela angústia do desconsolo.

Recebo então as carícias do teu maternal protocolo
e logo meus pés já não sentem o solo,
pois em sublimes pensamentos decolo.

E neste vôo, tendo teu manto como apoio,
alcanço o Coração do Divino Consolo,
onde colo meu dolo e obtenho o óbolo do Perdão Prazeroso.

sábado, 11 de junho de 2011

Fome

Café da manhã reforçado: uma fatia de pão, queijos brancos, frios à base de carne de aves, leite desnatado, frutas diversas e suco de laranja com aveia. Lanche das nove com três biscoitos sem recheio, frutas e líquidos à vontade. No almoço, folhas verdes, vegetais crus, duas colheres de sopa de feijão, duas colheres de sopa de arroz, um pedaço de bife na chapa e frutas da estação para acompanhar. No lanche das quinze, dois pãezinhos de queijo com um copinho de suco. No jantar, uma sopinha vegetariana acompanhada com pães e um pequeno pedaço de peixe grelhado. Dieta recomendada pelos melhores nutricionistas e por outros profissionais afins. Mas nada disso ameniza a louca fome que me angustia já há alguns dias. Cansado e fraco, tomo uma atitude extrema: volto à mesa que há muito não ia, devido à correria desta vida de idas e vindas.

Após o banho e o jantar que não sacia, adentro ao meu quarto e tomo assento na rede branca, sempre presente nos lares cearenses, onde será o local da ceia. Eis-me aqui, digo fazendo o Sinal da Cruz! Logo chamo Aquele que irá servir a mesa: "Vinde Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o Fogo do Vosso Amor..." E Ele não tarda! Sempre no tempo certo. Tempo que é dEle.

Mesa posta, à luz de velas? Não, Luz do Mundo! Uma pitada de Sal da Terra. Abro então a Palavra! Sagrado alimento, da alma um sustento. O Pai e eu, numa comum e santa união. Servindo, o Santo Espírito. Garçom que conhece os nossos pratos preferidos, ainda que nós não os conheçamos. Restaurante sempre aberto, comida sempre quentinha, aguardando as almas famintas virem saciar as suas mais íntimas, e muitas vezes desconhecidas, necessidades.

Após essa maravilhosa Refeição, despeço-me do Senhor e lanço-me nos braços do sono, sabendo que Ele não irá a lugar algum, pois ficará velando os meus sonhos. E aos prudentes de plantão, digo: Não precisa aguardar a digestão! Ela ocorre naturalmente, no coração de todo bom cristão!

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Bem-aventurada aventura

Nas desventuras desta vida de amarguras,
me ponho a fazer loucuras que,
porventura, não me competem.

E as faço com a divina permissão
que me permite, até mesmo,
ferir o Divino Coração.

E na aventura da busca de minha Redenção,
encontro-me com a Bem-aventurada, Virgem repleta da Unção.
Ave, Cheia de candura! Enlaça-me no teu regaço de ternuras e lança-me nas Formosuras do ferido Coração.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Passos

Passo,
passo,
passo,
passo...

Outro passo,
mais um passo...
e em cada passo, um passo
neste divino e humano compasso.

Assim vou seguindo
no longo caminho
que se faz em cada passo,
numa sequência indefinida de passos.

Surgem então os percalços,
que me prendem em seus laços,
e em lágrimas me desfaço.

Mas logo surge um Braço,
que rompe as cordas de aço,
e no Seu Abraço me refaço.

Nele então me enlaço,
as botas do pecado eu descalço
e, descalço, continuo os passos.

Ultrapasso a dificuldade,
ultrapasso o obstáculo,
ultrapasso a tempestade.

Só não ultrapasso a Graça
que revela meus traços de Filho do Alto
e que me dá Forças para continuar meus passos.

E vou seguindo: passo, passo, passo,...